Los Hermanos: a última grande banda do Rock Brasil
10 motivos que tornam os barbudos o maior nome da sua geração
O revisionismo da década de 1990 se intensificou nos últimos tempos com o horrendo filme dos Mamonas, a honesta cinebiografia de Claudinho e Buchecha, a volta do É o tchan e até mesmo com turnês comemorativas do Pato Fu e o fim do Skank.
Mas à parte do sentimentalismo tolo que é recorrente quando estamos diante de algo que nos traz memórias de outro tempo, é preciso colocar alguns pingos nos is a partir de fatos (e nem sempre de opiniões). E neste caso, há uma verdade incômoda que eu queria pontuar: Los Hermanos foi a última grande banda do rock brasileiro.
Ao xiitas ou haters do grupo carioca, podem chiar. Mas duvido que consigam refutar os fatos que vou elencar logo abaixo. Vamos a eles e engula essa.
1 | Um hit para lembrar (e esquecer)
Pra começar, vamos com Anna Júlia. Ao lado de "Mulher de fases", foram as duas canções que fecharam a década de 1990 ultrapassando a barreira “das AM, FM e dos elevador”. E quem viveu ali sabe: a porra da música tocou na rádio, na TV, no Carnaval, ganhou versão gringa com direito a George Harrison nas guitarras.
E encheu tanto o saco que a própria banda parou de tocá-la por uns anos. Mas serve para lembrar: artista grande tem hit que vai além do seu nicho. Então, põe o primeiro ponto na conta dos barbudos.
2 | Sem vergonha de referenciar outros estilos
Desde o primeiro álbum, a mistura de hardcore com samba canção do Los Hermanos já soava peculiar. Mas no universo dos anos 90, onde o Raimundos inseria forró no rock e o Planet Hemp cruzava rap e metal, isso era só um detalhe.
Contudo, mesmo que todo o rock daquela época começasse a introduzir outros estilos, os cariocas foram além. E em uma época em que o Belchior não era cult (mas sim música do seu pai), eles foram lá e gravaram música do cara, cantaram com ele em programa de TV, fizeram cover de Roberto e o vocalista até participou de álbum do Sandy e Júnior e Ivete Sangalo.
Acredite, hoje isso soa normal, mas falamos de uma época em que o Carlinhos Brown tomava latada no Rock in Rio e Sepultura era chamado de vendido por incluir os índios xavantes em uma única canção. Ou seja, pra hoje um artista fazer uma mistureba sonora em sua música, alguém lá atrás abriu o caminho. E mais uma vez, eles estiveram na vanguarda da coisa.
3 | Vire as costas para o sucesso e faça o que quiser
No auge do sucesso, após o estouro do primeiro álbum, o Los Hermanos fez seu movimento mais arriscado. Gravou um álbum soturno, que mandava à favas a alegria carnavalesca da estreia e trazia ao público a tristeza da quarta-feira de cinzas.
Vendeu pouco, foi visto como estranho, mas ali começou a atrair uma legião de fãs que, segundo eles, “era menos gente mas que curtia muito mais”.
Quem assistiu a turnê do Bloco do eu sozinho sabe do que tô falando. A reação do público era insana em cada música e só tinha comparação no Brasil com o que a Legião Urbana fez antes. Três a zero pros caras.
4 | O indie no mainstream sem deixar de ser indie
Na metade da década de 2000, Ventura veio ao mundo e a banda se tornou um sucesso de nicho. E um nicho confuso, já que indie não quer dizer coisa alguma. Mas em shows de médio porte, a loucura continuava e, ao mesmo tempo, medalhões da MPB passaram a elogiar e gravar os caras. Por exemplo, Lanny Gordin, Adriana Calcanhotto, Maria Rita e Ney Matogrosso.
Mesmo com novos arranjos e uma musicalidade mais tradicional, tudo ainda era cult e isso ampliou o alcance dos caras. E aí chegamos ao próximo tópico.
5 | Todo mundo quis ser Los Hermanos
Houve um tempo em que toda banda independente tentou soar como o Los Hermanos. Seja pela mistura de estilos com rock, seja por usar as mesmas influências de canções brasileiras, Beatles, Strokes e o escambau.
Entre boas surpresas e besteiras esquecíveis, tivemos Gram, Ludov, Parafusa, Volver, O terno, Bazar Pamplona e mais outras 204. Até hoje há resquícios deles no Validuaté, Harmada, Cícero ou Silva.
6 | Estádio lotado para turnê de despedida
Em uma das várias turnês de despedida (sei lá quantas aconteceram), o Los Hermanos, sozinho, conseguiu a proeza de enfiar 42 mil pessoas no Maracanã, em duas noites. Ok, hoje tem o Skank que fez o mesmo no último show no Mineirão no ano passado, o Titãs na reunião dos ex-integrantes e o NXZero na sua atual turnê de retorno.
Mas até ali, de novo, só a Legião Urbana (e o RPM, no auge do álbum ao vivo) havia feito o mesmo.
7 | Coesão em toda a discografia
Tá, o Los Hermanos teve apenas 4 álbuns de estúdio. Porém, num feito quase sem precedentes em nomes do rock, chegaram a tocar nas respectivas turnês todas as faixas de cada um deles.
Ou seja, eles apostaram tanto no material que não deixaram de fora nenhuma música lançada. E vamos combinar: é algo bem difícil para fã escutar na íntegra um álbum novo, mas para os fãs do LH isso parecia necessário.
8 | Projetos paralelos de sucesso
Eu não curto muito nem a Banda do Mar nem o Little Joy. Porém, o Los Hermanos teve duas bandas com integrantes que também fizeram um baita sucesso. A primeira, inclusive, revelou a namorada (chatinha, por sinal) de Camelo ao mundo e, a segunda, tinha até o baterista dos Strokes em sua formação. O que não é pouca coisa.
9 | Fã ou hater: sem meio termo
Tem gente que ama Charlie Brown Jr, tem quem odeia (eu, no início da fila) e quem não liga. Mas dificilmente você vai encontrar quem acha o Los Hermanos tanto faz. E na última comparação que faço com a Legião, eles conseguiram o mesmo que a banda do Renato Russo: as pessoas são fãs ou haters e ambos com intensidade.
E excetuando os Beatles (quem não curte Beatles não merece estar neste mundo), tente lembrar todas as grandes bandas e encontre este padrão: elas despertam sentimentos controversos e profundos. O que pode, provavelmente, indicar que são maiores do que a gente gostaria ou do tamanho que a gente admira.
10 | Nenhum outro nome grande em duas décadas
Por fim, uma contestação triste para quem, como eu, ama rock. Ele continua em coma em terras brasileiras e, não fosse pela Pitty carregá-lo a duras penas sozinha no mainstream nos últimos 20 anos, teria sido enterrado.
Contudo, nem a baiana consegue ser um farol quando o assunto é referência. Ela tem qualidade, longevidade e tal, mas pela tour de 20 anos do seu primeiro álbum, quem a viu ao vivo sabe: o cenário é outro e os últimos discos dela não causam um impacto capaz de colocá-la como o novo nome do estilo e brigar sozinha não vale. E sim, isso é ruim.
Mas até que outras bandas furem a bolha na era do streaming, singles e views, eu reafirmo: vou ficar feliz demais quando outro artista do rock assumir o posto de maior banda do rock brasileiro. Até lá, o título descansa em paz nas mãos de quem declarou que todo Carnaval tem seu fim e continua, em silêncio, causando folia e caos nos amantes da boa música.